terça-feira, 31 de agosto de 2010

Coisas do acordar

O calor que faz nessa cidade me fez ter o hábito de manter as janelas sempre abertas. Acostumei-me a dormir olhando as estrelas e a lua. Ver a chuva cair sem ser atingida. E acordar com o amanhecer que clareia aos pouquinhos, mesmo nos dias nublados. Nos meses de verão é a brisa que me desperta, aliviando a temperatura de uma noite quase tão quente quanto o dia.

Nesses dias algo novo nessa rotina aconteceu. Meus olhos que ao despertarem rapidamente contemplam o céu que desfila na minha janela tiveram mais dificuldade para vê-lo. Meu rosto que é sempre tocado pela brisa, também demorou a senti-la. Meu corpo sempre, bom...quase sempre, ágil e disposto a movimentar-se quando acordo, estava praticamente inerte. Algo de muito errado estava acontecendo. Foi quando me dei conta da minha infidelidade e que a conseqüência seria penosa. Por uma noite troquei a segurança e o aconchego por um fuleiro safado que não está nem aí para a integridade do meu corpo. Ah...essas bobeiras que a gente faz na vida. Uma noite apenas e, diga-se de passagem, nem foi lá AQUELA noite! Mas agora já é tarde, esse bendito torcicolo me ensinará direitinho o que acontece quando se dorme com o travesseiro errado.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Coisas que acontecem

Há dias que são dias, costumo dizer. Onde o que governa é a intensidade com que se vê certos imponderáveis da vida. Pode ser a raiva que explode, a frustração que domina, a decepção que prostra, o abandono que fere, a tristeza que emudece, a saudade que aperta, o gesto que comove, a alegria que transborda, a ansiedade que eletrifica, o desejo que arrepia ou o amor que suspira. Porque há dias em que essas coisas acontecem de arrebato. Sem aviso prévio. Ou talvez seja assim que a gente percebe que elas acontecem.

Há dias que são dias. Porque o corpo fica desperto e se sente mais do que nunca que se está vivo e que o coração pulsa.

Há dias que são dias. Onde o que se quer é a cumplicidade de um olhar, o afago de uma mão terna, o aconchego de um abraço, a luz de um sorriso, o companheirismo de um silêncio, a paz da solitude, a irreverência de uma graça, o som de uma gargalhada, o contentamento de uma aproximação, o cheiro de uma pele, a união de corpos, a delicadeza e o calor de um beijo.

Há dias que são dias porque o que acontece mexe com o corpo e a alma da gente.
Há dias que são dias porque os outros dias são simplesmente....dias.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Coisas desse menino Maycon

Dizem por aí que o baiano tem um ritmo diferente. O tempo e a ação dos baianos obedeceriam a uma lógica única. Tudo se desenvolve com certo vagar despreocupado. Ah, mas não é tão simples assim. Principalmente se você conhecer esse menino Maycon. Menino franzinho, olhar sempre distante e distraído, de andar arrastado e ao mesmo tempo firme. Eu acho graça nas suas expressões faciais quando algo está rápido demais, cansativo demais ou pesado demais. Algo como fora do ritmo que a vida lhe deu. E aí que vem a pausa pro cigarro. A estratégia máxima para trazer tudo em volta ao seu ritmo preferido. Se você não vai acompanhá-lo, tudo bem. O importante é que ele chegará lá também. E chegará bem. Pode apostar.

Acredito que haja um descompasso quase constante entre seus pensamentos e suas ações. Eu sempre “sinto” que os pensamentos desse menino Maycon estão muito além do aqui agora. Há quem ache que pessoas assim estão fora de órbita. Pode até ser. Mas não se iluda. Porque pessoas como esse menino Maycon quando resolvem botar pra fora tudo aquilo que estão curtindo por dentro são capazes de arrasar quarteirões. Provocam terremotos com suas provocações tão certeiras e afiadas. Faz lembrar até aquele bordão humorístico: “Mexe com quem tá quieto”. Há uma inocência nada inocente, me permito dizer. O sorriso solto é só na proximidade. Apenas na intimidade. O abraço é pra aquecer. É pra levar um pouco dele com você. Sempre.

Esse menino Maycon tem a alma inquieta. Não de qualquer inquietação. Mas do tipo próprio dos poetas e desbravadores, que também não seguem no ritmo do mundo. Por essas coisas que me cativa tanto esse menino Maycon.
Agora esse menino Maycon vai experimentar outras paradas, perder seu olhar em outras paisagens e soltar o verbo com outros sotaques. E que nossos patrícios se cuidem, porque tudo será no ritmo...dele.

Para esse menino Maycon eu pego emprestado a poesia de outro baiano pra dizer que depois dessa nova aventura que começa agora “um dia vou ver você/ chegando num sorriso/ pisando a areia branca/ que é seu paraíso.” E “debaixo dos caracóis dos seus cabelos/ uma história pra contar/ de um mundo tão distante”. Faça uma deliciosa viagem, meu caro amigo.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Coisas da necessidade

Dizem por aí que a TPM deixa as mulheres com os sentimentos à flor da pele. Seríamos capazes de matar, trucidar, decepar, picotar, soltar os cachorros e rinocerontes contra o sexo oposto. De fato, devo dizer que os estudos existentes são pouco conclusivos. Claro, grande parte deles foi produzido por homens! Desse modo, não poderíamos esperar muita coisa mesmo. Então permanece cercado de mistérios, já que as mulheres sentiriam e sofreriam cada qual de um jeito.

Além disso, essas reações podem mudar com o passar dos anos. Por exemplo, se na adolescência a TPM pode se expressar através de estridentes gritos e atitudes que facilmente poderiam ser confundidos com uma rebeldia típica da idade, na fase adulta pode se transformar num mero, mas muito eficiente, olhar ameaçador. Seria um traço da evolução da espécie? Enfim, dizem por aí que nós mulheres todos os meses, durante essa fase, vamos aprimorando nossos comportamentos. E pobres homens e outros familiares procurariam alternativas para sobreviverem a esse período geralmente tempestuoso. Já ouvi boatos de facas e tesouras que misteriosamente somem por alguns dias. Viagens de trabalho sempre na mesma época. Se não me engano ouvi falar algo de colete à prova e balas, roupas almofadadas, mas aí já acho um tremendo exagero.

Contudo, parece que há uma coisa que melhoraria o humor de 9 a cada 10 mulheres em TPM. Dizem por aí que é tiro e queda. Efeito imediato. Como, nesse caso, eu sou como São Tomé, SÓ ACREDITO COMENDO! Então, eu peço que me ajudem a comprovar os efeitos desse medicamento criado pela MARIA BRIGADEIRO. Aceito contribuições. Porque vocês bem sabem, eu poderia roubar, matar, mas estou aqui pedindo humildemente para que me ajudem a adquirir esse remédio, muito recomendado. Caso contrário...te encontro na minha próxima TPM....

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Coisas de Pedrão

Desconfio que São Pedro designou uma nuvem para me perseguir. Sim, eu sei que ainda estamos no tempo das chuvas, que elas são comuns, que não me atingem unicamente. Mas já começo a achar que Pedrão tá gostando dessa coisa de mandar chuva SEMPRE alguns metros antes de eu chegar ou logo depois de eu sair do trabalho. Algo do tipo distante o suficiente do ponto de saída e de chegada e sem qualquer lugar para se abrigar.

Você pode estar se perguntando: “sua tapada, por que não anda de guarda-chuva?” Pois é, eu bem que tentei. Já tive uma sombrinha como também aquele preto gigante. Mas entenda, a chuva do inverno baiano não vem sozinha, ingenuamente, como quem não quer nada. Ela vem devidamente acompanhada com ventos fortes. E eu posso lhe garantir que não há pessoa nessa cidade que já não tenha pagado um bom mico, protagonizando cenas dignas de uma vídeocassetada ou de algum filme famoso.

Se o seu guarda-chuva, adquirido em loja “a partir de 1,99” ou de um “pequeno empreendedor” que você esbarrou em alguma esquina por aí, for suficientemente resistente para não ser retorcido ou despedaçado, muito provavelmente você terá sua calça molhada até acima dos joelhos. Acho que Pedrão deve se divertir com nossas (des)habilidades em segurar o cabo, a bolsa e ainda tentar desdobrar a lateral do guarda-chuva que insiste em ficar virado pro lado errado. O que dizer então das tentativas de segurar aquele preto enorme que insiste em querer ser como aquela velha música cantada pelo Biafra e “voar, voar, subir, subir”. Para aqueles com 1,50m de altura, como eu, pode até significar a realização de um sonho de infância e começar a voar como Mary Poppins. Ou ainda se transformar numa versão de saias do Gene Kelly cantando na chuva. No meu caso, já realizei os dois. O problema vai ser se Pedrão resolver radicalizar e passar dos musicais para as aventuras, tais como, Náufrago, Twister, A Arca de Noé...

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Coisas da natureza

O mar sempre me trouxe boas conversas e desabafos. O som das ondas, a cor da água, a linha do horizonte que se mistura...e o vento vai levando tudo embora, como diria o Renato Russo. De alguma forma sempre me senti abraçada pelo mar. Ele me solta, me deixa livre, me deixa em paz.

E agora veio a terra me mostrar que ela também pode trazer paz em vida, não apenas na morte. Eu fecho os olhos e vejo aquele teto de pedra, com suas camadas que na profundidade e na escuridão formam um céu desenhado. Um céu noturno, parcialmente nublado. Algo como um campo bem longe das luzes da cidade, iluminada apenas por lampiões. Engana os olhos e o sentido, pois por segundos até parece que não há limite ali, faz parecer uma imensidão. Ao ser convidada para ficar na total escuridão e silêncio, senti a terra me aconchegar.

Cruzei a extensão daquela gruta admirada com suas esculturas naturais produzidas pelo pingar ininterrupto das águas. Ao sair de lá tive a certeza que eu também não passo de um grão de areia.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Coisas da ambição

Tenho esbarrado com tanta gente que está em uma busca obstinada e angustiada por certezas e seguranças dessa vida. E o que eu tenho a oferecer é apenas perguntas sobre as muitas coisas que ainda não sei e as supresas que tive com as coisas que eu nem imaginava que poderia um dia descobrir.
Dizem que eu não tenho ambições. Talvez porque meus desejos verdadeiros não sejam aqueles que mobilizam as grandes ambições do mundo. Mas eu desejo sim, um mundo que está contido em cada dia. Tudo aquilo que faz pulsar. Eu desejo a plenitude todos os dias. E isso é deveras ambicioso, ô se é!

domingo, 1 de agosto de 2010

Coisas do amor

E mais de uma década se passou desde daquela tarde quando eu a vi pela primeira vez naquele banheiro no fundo do quintal. Um corpo pequeno, frágil, quase totalmente despido e de proporções distorcidas. Praticamente a cópia do pequeno ET que tenho grudado na porta da minha geladeira. Exceto pelo tom esverdeado, é claro. Era tão feinha, perto da exuberância exibida por sua irmãzinha, siamesa mestiça, já com lindos e sedutores olhos azuis. Mas foi amor à primeira vista. Arrebatador. A sensação e a imagem deste dia estão gravadas em contornos profundos na minha alma. Maluca é um dos amores da minha vida. Foi minha fiel companheira por 11 anos. E até na morte, há exatos 1 ano, assim permaneceu. Sua curiosidade e resmunguice eram cativantes. Mesmo para aqueles que não gostavam de gatos, por desconhecimento ou falta de apreço.

Dizem por aí que cada vez mais as pessoas exageram no amor por seus animais de estimação. Dizem ainda que se trata de um tipo de relação que visa sanar problemas de afetividade, carências de vidas vazias de relações humanas satisfatórias. Pode até ser que o estereótipo das pessoas, insanas, solitárias e que vivem somente com seus animais, seja a expressão de um mundo de perdas, abandonos e vazios. Mas será que é mesmo? Tá, posso concordar em vários aspectos que as carências humanas tem transformado os animais em brinquedinhos vivos, não só pelos solitários, mas para aqueles que moram com sus próprias famílias. Por outro lado, fico me perguntando se é possível descartar a existência de um amor mais pleno pelos seres. Andem eles em duas pernas ou quatros patas.

O sentimento que Maluca me despertou é do mesmo tipo que me despertam certas pessoas. São os múltiplos amores de minha vida. Eu quero estar com eles, protegê-los, incentivá-los, deixá-los livres, mostrar e compartilhar com o mundo o quanto esses amores são para mim a completude. Não importa se é amizade, se é romance, se é eterno ou passageiro, se é homem, mulher ou animal minha afeição, dedicação, meus pensamentos e orações são igualmente plenos. E a saudade também assim o é. Particularmente hoje, a minha saudade se avolumou daqueles que agora só me permitido reencontrar através das memórias.



Eu não sei explicar, porque algumas palavras me parecem sempre reduzidas perante a intensidade desse tipo de sentimento. Mas veio a mente Milan Kundera na belíssima reflexão do amor que sua personagem Tereza sentia pela cadela Karenin quando esta morreu. Embora eu me debulhe em lágrimas toda a vez que leio, é uma das minhas partes prediletas do livro. De certa forma, me reconheço nesse amor:

"[...] Tereza aceitou Karenin tal qual é, não procurou transformá-la para que ficasse semelhante a si própria, aceitou de antemão seu universo de cachorra, não quer lhe confiscar nada, não sente ciúmes de seus desejos secretos. Se a educou, não foi para mudá-la (como um homem quer mudar sua mulher e uma mulher seu homem), mas apenas para lhe ensinar a linguagem elementar que lhe permitisse se compreender e conviver. E mais: seu amor ao cão é um amor espontâneo, não foi forçado por ninguém. [...] O amor entre o homem e o cão é idílico. É um amor sem conflitos, sem cenas dramáticas, sem evolução." (A insustentável leveza do ser)